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sexta-feira, 4 de junho de 2021

FESTA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO

    

imagens ajustadas a esta plataforma de: Leandro Foto


    Uma das festas essencialmente comunitária em minha terra natal, Penha, Santa Catarina, acontece há 185 anos. É a Festa do Divino Espírito Santo, evento de tradição portuguesa trazida pelos portugueses que colonizaram a região litorânea.
    Coroado o Imperador daquele ano, sorteia-se, entre doze inscritos, o nome do imperador do ano seguinte que, eleito, a partir desse instante começa com as tratativas para os festejos do evento vindouro. Dalí, desencadeia-se o início dos preparativos, com os convites aos festeiros e recebimento das doações do povo em geral, em espécie (dinheiro) e bens materiais ao imperador responsável em promover uma grande festa com comida farta à comunidade e aos convidados de fora. Mais tarde, “visitas da bandeira do Divino” pelo cortejo, até às vésperas da novena do evento principal, aos fiéis convidados como o Trinchante, Alferes, Empregados de Vela, Empregados de Bandeira, Espadins e demais representantes.
    Meu avô paterno foi um dos Imperadores e depois meu pai, em 1950. Lembro-me, ainda muito jovem, dos detalhes e preparativos. (Tão jovem eu era, que quando adulto queria saber o que seria Pai do Espadim, que minha família tanto falava e, finalmente, descobri que eram: Pajens e Espadins). Papai, comerciante local, abriu uma conta bancária somente para os depósitos de doações recebidas que cresciam a cada dia. Antecipava-se a encomenda de tecidos e acertos com alfaiates e costureiras às confecções de alfaias; encomenda ao artesão de fogos de artifício, dos foguetes para os eventos principais e principalmente à grande queima de fogos da noite de véspera da Festa; contratos com os foliões – músicos responsáveis pelas cantorias; construção de chiqueiros à criação de leitões especiais; doações de novilhas e de cordeiros para engorda que ficavam sob cuidados de vizinhos e parentes. Tudo era às expensas dos fiéis, embora papai despendesse também.
    Com a aproximação da data começavam as doações em gêneros alimentícios de consumo oportuno; de criações vivas como patos, marrecos, perus, faisões e outros galináceos, que de tão abundantes foi preciso improvisar um enorme cercado com galinheiros. Quase às vésperas, chegavam produtos como trigo, farinha de mandioca, açúcar, feijão, arroz, macarrão.
    Já na semana da festa, formavam-se os mutirões para o corte de palmeiras (palmiteiras) na mata, as quais eram afixadas a ladear as vias do percurso próximo à igreja, onde aconteceria a celebração, e de nossa casa, local em que seria servido o almoço. Nos espaçamentos entre palmeiras, pendiam linhas munidas de bandeirolas multicoloridas a trepidar ao vento, enquanto o pavimento era alcatifado com flores e folhagens em desenhos sugestivos ao evento.
    Eram erguidas armações com cobertura de lonas em forma de grandes barracas à proteção de mesas e bancos improvisados sobre estacas cravadas no solo com madeiramento encimando feito assento e tablados a formarem tabuleiros de mesas às refeições. Talheres e louças chegavam por empréstimos da vizinhança. Por fim, no dia, todos se fartavam com as iguarias que se costumava oferecer aos convivas. E por mais um ou dois dias, a comilança permanecia com as sobras e complementos de cocção de suplementares acompanhamentos, a terminar as bebidas. (xarope de groselha, capilé, consertada, refrigerantes, vinhos, cervejas, vinhos frisantes...).
    Ao passar do tempo, diversas mudanças operaram-se ao ritual da festa, mas o louvor ao Divino continua, e com o mesmo cortejo que segue ao som da viola tocada pelo mestre folião, (em primeira voz), da rabeca tocada pelo contra voz e do tambor pelo batuqueiro na terceira voz, popularmente alcunhada de tripa.
A fé ao Divino Espírito Santo representado sob o símbolo de uma pomba, conforme o Novo Testamento, mantém-se forte.
    
“É a fé, é a esperança, é a paz, é o amor. / É assim nossa bandeira,  por todo lugar que for. / Essa é a nossa festa, nossa gente já chegou / trazendo a imperatriz e o senhor imperador. / O imperador agradece sua valiosa oferta, / transformando em alimento no dia da grande festa. / Se Deus quiser, o ano que vem,  a nossa bandeira volta / com o outro imperador entrando em sua porta”.
Recitado pelo mestre folião da Festa do Divino José Olavo Coelho.


Coroação do Imperador 

Abaixo, fotos da festa do ano de 2021, que teve como Imperador o Senhor Romualdo Waltrick e a sua esposa Márcia Zimmer Waltrick representando a Imperatriz.


Guião com a Pomba do Divino Espírito Santo que vai à frente do cortejo


Imperador e a Imperatriz na 185ª Festa do Divino em Penha


Imperador com a senhora Imperatriz ao cortejo, cercados
pelo quadro de varas enfeitadas que os 4 Empregados de 
Vara as sustentam à altura dos quadris.  


Foliões da Festa 



Meninas dos Sete Dons do Divino Espírito Santo


Coroa e o cetro sobre a salva (todos em prata). 


Imperador e Imperatriz com as meninas

Vista parcial do interior da Igreja Nossa Senhora da Penha 


Os pães bentos


Curiosidade - mini-candeeiro português em ouro 18k (popularmente - pomboca, candeia, lamparina) alimentado a óleo de peixe ou a querosene (atualmente). Ele estampa a pombinha com os sete dons do Divino Espírito Santo (em alto-relevo).

P. S. -– Expresso minha gratidão à escritora, historiadora e professora, doutora Lélia Pereira Nunes, com robusta bagagem literária de pesquisa sobre cultura açoriana histórica e das que ainda remanescem, como a Festa do Divino Espírito Santo, tão viva na vida social do catarinense do litoral de nosso Estado, que editou matéria em página do jornal “PORTUGUESE TIMES”, pela excelente postagem referente às Festas do Divino neste ano pandêmico, que enalteceu minha terra natal – Penha, SC, efetivando sua 185ª Festa. 

“É tempo de Espírito Santo na cartografia açoriana do Mundo” – página18: https://www.portuguesetimes.com/admin/archive/Edic%CC%A7a%CC%83o%202609%20-%2023%20de%20junho%20de%202021.pdf 

Agradeço, igualmente, a CASA DOS AÇORES DE SANTA CATARINA, representada na pessoa do presidente da entidade professor doutor em história cultural Sérgio Luiz Ferreira, nativo da Ilha de Santa Catarina, grande autoridade em história do povo açoriano e renomado pesquisador na área genealógica dos açorianos emigrados ao território brasileiro, pela divulgação desta matéria.

Casa dos Açores de Santa Catarina 19 de junho às 18:51 

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